Em primeiro lugar gostaria de destacar o art. 37, CFRB/88, que preceitua o princípio da legalidade para a administração pública, qual seja, ela está obrigada a fazer somente o que estiver previsto em lei. Dessa forma, a polícia militar, como órgão da administração pública, tem que seguir os mesmos princípios.

A polícia militar é dividida entre as praças e os oficiais, a este cabe a função de comando, direção e chefia, conforme preceitua o Estatuto dos Militares, pois são preparados ao longo da carreira para essa missão.vJá as praças têm a missão de apenas executar aquilo predeterminado pelos oficiais, exceto os subtenentes e sargentos que poderão comandar de forma auxiliar àqueles.

Diferentemente, são os cabos e soldados os quais foi reservado a missão de execução, não podendo de forma alguma comandar, dirigir, chefiar sem a correspondente gratificação do exercício de função, nos termos do Estatuto dos Militares. Se os cabos e soldados são essenciais elementos de execução como poderão liderar, comandar, dirigir uma viatura, com dois a três outros cabos e soldados?

É importante destacar que o comandante da viatura tem a responsabilidade de: resolver as ocorrências, determinar a forma ou como deverão seguir os demais componentes, dizer o trajeto da viatura, a hora que irão parar para refeições, de apresentar o pleito dos outros policiais militares que estiverem sob seu comando aos superiores hierárquicos.

Se tal fato ocorrer é notória o desvio de função, haja vista, que a atividade de comandar, chefiar e dirigir são privativas dos oficiais e de forma complementar e auxiliar dos Subtenentes e Sargentos. Ademais, a função de Comandante de viatura é a soma de autoridade, deveres e responsabilidade de que o militar investido tem de conduzir ou dirigir os demais componentes do grupo ou viatura. Sendo assim, se tais funções forem exercidas por cabos e soldados que são elementos de execução, eles deverão perceber a Gratificação do Exercício de Função. Por fim, o RISG (REGULAMENTO INTERNO E DOS SERVIÇOS GERAIS) que aplica aos militares estaduais, preceitua em seu art. 410, o seguinte:

“Em tempo de paz, não haverá substituição de subtenentes e sargentos por cabos e destes por soldados”.

Assim, em muitos Estados a administração pública flagrantemente, descumpre o regulamento militar, por isso, ao analisar os pleitos referente a tais gratificações dos militares não podem deferir somente aos militares que tenham determinado curso. Tal exigência, fere diversos princípios jurídicos dentre eles “venire contra factum proprium”, ou seja, vedação do comportamento contraditório, tal princípio encontra respaldo nas situações em que uma pessoa ou ente, por um certo período de tempo, comporta-se de determinada maneira, gerando expectativas em outra.

Existem, portanto, quatro elementos para a caracterização de tal princípio: comportamento, geração de expectativa, investimento na expectativa gerada e comportamento contraditório. Em tais casos é notória a má-fé do Estado e o comportamento contraditório, haja vista, que indefere os requerimentos de exercício de função, mas continua ao longo do tempo empregando tais praças com desvio de suas funções.

O QUE OS CABOS E SOLDADOS PODERÃO FAZER?

Sendo assim, os soldados e cabos que assumirem o comando de viatura ou o comando de efetivo poderão realizar um requerimento pedindo a remuneração do posto de 3º ou 2º Sargento de acordo com a organização do Quadro de Organização da Organização Militar, em virtude do desempenho de atividade privativa de graduação superior, em caso de negativa, poderão pleitear via judicial. Em regra, as legislações militares estaduais têm um dispositivo semelhante a este da Lei nº 10.426, DE 27 DE ABRIL DE 1990, previsto para os militares estaduais de Pernambuco, vejamos :

Art. 11 O servidor militar no exercício de cargo ou comissão, cujo desempenho seja privativo do posto ou graduação superior ao seu, percebe a remuneração inerente àquele posto ou graduação, observados a precedência hierárquica e os requisitos da capacitação profissional exigidos para o seu desempenho.

Dr. Tiago O. Reis, é especialista em causas militares, foi 2º Sargento da Polícia Militar com mais de 10 anos de experiência na caserna, é profundo conhecedor da Legislação Militar, como Estatutos, Códigos Disciplinares e outros, inclusive foi instrutor de diversos cursos da área jurídica dentre eles Legislação aplicada a Polícia Militar, atualmente, é advogado e Diretor da JURIS PM.